terça-feira, 6 de maio de 2008

Eu vi o não, eu vi a bala matadeira.

O palco é uma entidade distinta do nosso raso senso de realidade. Não importa o quão insignificante o indivíduo possa ser: uma vez movido por paixão e determinação, não sobra rastro de sua aparência cotidiana. Não importam as imperfeições, pois todas elas adquirem um senso de propósito, de assimetria intencional. E o artista pode se desnudar, porque a sua vulnerabilidade lhe confere poder.

Foi o que percebi sábado.

De repente, apagaram-se todas as luzes do palco e começaram a ser projetadas animações estranhas e ininteligíveis em cima da banda. Esse recurso viria a substituir os canhões de luz durante toda a apresentação. E então ela sobe, marchando entre os músicos. Top branco, botas pesadas cinzentas. A calça parecia um suéter branco costurado sobre os quadris. Os usuais dreadlocks vermelhos eram entremeados por mechas tamanho máquina 5. Ela não possui um corpo escultural. Até pelo contrário. É baixinha e tem uma expressão leve, mas permanente, de cansaço. Tanto no rosto como na postura. Mas os olhos de fera sobressaem, assim como a linguagem corporal nosferática.

Rebeca Matta pode ser baiana, mas cabe mais em uma São Paulo pós-apocalíptica ou em uma Curitiba de Dalton Trevisan. O som é algo totalmente distinto. Como li em uma descrição dia desses, "é muito rock pra ser MPB, muito MPB pra ser rock e muito eletrônica para ser os dois". É Faith No More produzido por William Orbit e com Beth Gibbons no vocal. Não com aquele sentimento cool e distante, mas contundente como a Bethânia de "Carcará", sem perder o timbre suave e límpido.

Ninguém pareceu entender muito bem. Nem mesmo quando ela tentou chegar ao nível dos mortais com as suas perversões de "Mistério do Planeta", dos Novos Baianos, "Xique-Xique (Parabelo)", de Tom Zé, ou de duas da Gal ainda relevante: "Divino, Maravilhoso" e "Vapor Barato".

Mas ficou o impacto. Que é muito melhor do que a reles massagem no ego do publiquinho universitário lugar-comum.